Wednesday, March 08, 2006

Da memória

A sensação de estranheza causada recorrentemente pelo ato de recordar - o que seria? Um novo sujeito a contemplar antigas fotografias, dando-lhes inesperadas interpretações? ou nada mais que vazias tentativas de reescrever histórias tortas? Ou vaidosas inferiorizações das páginas amarelas, alimento para as mais egoísticas auto-idolatrias?

Saturday, March 04, 2006

historinha nonsense, mais uma vez.

durante um tempo demasiado longo, a menina permanecera em desconhecimento de sua intrigante peculiaridade. sempre que algo a inquietava, alguma expectativa a estremecer sob seus pés, ela se punha, quase mecanicamente, a imaginar caminhos enredos alternativas. em sua pressa atrapalhada de chegar à hipótese verdadeira, não percebia que a realidade (ou ao menos o que lhe parecia real) jamais corresponderia a qualquer uma de suas invencionices. era como se, ao transformar em pequenas conexões e descargas elétricas o que era apenas vagante possibilidade, ela pudesse eliminar toda chance de concretização completa - mesmo que a diferença não fosse mais que a cor de uma parede. um dia, tomou súbita consciência dessa habilidade e passou a utilizá-la em seu favor. ao esbarrar em situações de resultados nebulosos, dedicava-se a pensar em detalhes todos os cenários que não lhe eram convenientes. funcionou perfeitamente, por tempo suficiente para enganá-la. a confiança extremada em seu dom acabou por transformar a natureza de suas múltiplas ficções. ao contrário das antigas e absurdamente frágeis hipóteses, elas se transformavam em infalíveis profecias, tão inexoráveis quanto terríveis. a menina, já não sabendo como não imaginar, viu-se presa na infinidade de imagens especulares que ela mesma, cuidadosamente, criara.